A (In)Utilidade do Nosso Estado .
Em qualquer país situado no hemisfério norte e muito particularmente na Europa, existe uma relação directa entre os impostos cobrados e um conjunto de contrapartidas que o Estado concede aos seus cidadãos. As concepções mais liberais implicam menor carga fiscal mas também maior responsabilidade de cada indivíduo em assegurar as melhores escolhas na obtenção de serviços sociais que necessitará por toda a vida.
Porém em Portugal existe uma verdadeira originalidade que consiste no facto de ultimamente o aumento da carga tributária se traduzir ao invés de qualquer racionalidade, numa muito significativa diminuição dos apoios sociais prestados pelos sistemas públicos.
Dentre estes a educação assume especial destaque por se poder considerar um monumental desastre, com edifícios escolares sem qualquer conforto para os utentes – alguns novos sem isolamento térmico ou acústico e muitos outros que reprovariam em qualquer vistoria – onde a palavra disciplina desapareceu do universo escolar e permite a qualquer aluno boicotar sistematicamente o trabalho académico ou mesmo perpetrar agressões sem que a ele ou aos pais advenha qualquer sanção, o que é um caso único na União Europeia, até conselhos directivos sem capacidade ou conhecimentos de gestão e tudo isto rematado por uma tutela autista e impotente que desvaloriza o essencial e insiste em se concentrar em aspectos acessórios e populares. O produto final é uma despesa avultadíssima ao nível do primeiro mundo – 6106 milhões de euros em 2006 - e incompreensíveis níveis de iliteracia só comparáveis ao do terceiro.
A saúde encontra-se há décadas na mais absoluta auto-gestão, a avaliação do pessoal – que detém o privilégio único e inexplicável de poder acumular com funções privadas livremente - ou das instituições hospitalares, neste caso através de uma entidade independente recorrendo a indicadores internacionais e a constituição daí decorrente de um ranking , parece configurar um absoluto crime de lesa-majestade, de modo que a corporação em causa opõe-se tenazmente a qualquer espécie de escrutínio público. O desfecho é conhecido, milhares de pessoas aguardam longamente por uma cirurgia, doentes em sofrimento esperam madrugada dentro ao relento para conseguir uma vaga numa consulta num centro de saúde no interior do país, equipamentos subutilizados muitas vezes só explicáveis pela rede de vasos comunicantes entre o público e o privado mas sempre em proveito deste e detrimento daquele e a formação a conta-gotas de profissionais de saúde, em contraste com o facto de o Estado português optar por formar nas suas universidades maioritariamente advogados que o país não necessita e tem em excesso. Reduzir o número de vagas nas faculdades de direito e com os recursos poupados investir no apoio à formação complementar de médicos e enfermeiros no estrangeiro uma vez esgotada a capacidade nacional, seria um medida do mais elementar bom senso.
No horizonte próximo da segurança social paira a ameaça da falência, fruto da anarquia e do receio em tomar medidas eficazes no passado e da fraude reinante na atribuição de pensões de reforma elevadíssimas ou antes do tempo sem que para muitas delas tivesse existido uma proporcional correspondência nos descontos para o efeito.
Na justiça nem vale a pena falar, em muitos tribunais cíveis aguarda-se pelo dia do juízo final para a conclusão de processos.
Assim facilmente se conclui que ao cidadão português só lhe resta para sua sobrevivência a padrões mínimos, optar por uma escola privada, recorrer a uma seguradora para obter um serviço de saúde e subscrever num banco um produto de poupança-reforma ou então não o podendo fazer, emigrar de vez. Cabe então perguntar e os impostos para que servem? Bom para pagar a encenação grotesca de um Estado fraco a quem um conjunto de corporações chantageia em busca de mais mordomias e vários lobbies todos os dias exigem mais dinheiro para apoiar pseudo-investimentos de sustentabilidade duvidosa, com argumentos patéticos em que o risco é suportado pelos contribuintes e os lucros são largamente protegidos de qualquer incidência fiscal por largos anos. Sectores sem qualquer relevância nas exportações (à excepção do vinho desde a presença fenícia na Península) ou na criação de riqueza (com peso insignificante no PIB) como as praticamente inexistentes agricultura e pescas, arrogam-se no direito divino de receberem perpetuamente subsídios pagos pelos contribuintes, isto apesar de já receberem avultadas compensações como combustíveis a preços reduzidos e fundos de toda a ordem, sem que a produtividade nesses sectores tenha tido qualquer salto qualitativo ou revelado capacidade de gerar novas indústrias alimentares a jusante, aqui o imobilismo parece compensar largamente.
Qual o Estado que queremos? O modelo vigente decididamente não serve e pior que tudo é a constatação da inexistência de uma opção alternativa credível a curto ou médio prazo, sobretudo quando no Parlamento um grupo de deputados apresentou como projecto de resolução nesta altura imagine-se, a instituição do dia nacional do cão!
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