Guerra Civil de Espanha - Foi há 70 anos !
O conflito espanhol foi um dos acontecimentos marcantes do século passado e não nos passou propriamente ao lado; não posso deixar de recordar a presença portuguesa no conflito nomeadamente através de dois combatentes que em campos opostos tiveram uma importância reconhecida no país vizinho mas que são completamente ignorados em Portugal, estou a referir-me a José Sepúlveda Veloso e a Inácio Afonso Anta. O primeiro destacou-se como aviador na Base de Pollensa na ilha de Maiorca em poder dos nacionalistas tendo realizado inúmeras missões de combate sobre a Catalunha e vindo numa delas o seu aparelho a ser abatido; foi feito prisioneiro e esteve prestes a ser fuzilado no Castelo de Montjuich – actualmente um local aprazível para visitar – vindo a ser objecto de permuta por um aviador republicano detido pelos nacionalistas e continuou a realizar missões aéreas a partir da base das Baleares durante a 2ª Guerra Mundial na chamada não beligerância espanhola. O segundo prestou serviço à república espanhola e ascendeu a coronel e comandante da Defesa Anti-Aérea do sector de Barcelona, tendo após a conquista pelas tropas de Franco da Catalunha no inicio de 1939 integrado a marcha dos refugiados em direcção à fronteira francesa. Irá aderir à Resistência em França lutando contra o III Reich e mais tarde virá a incorporar-se no exército soviético, chegando a ser promovido a tenente-general de Artilharia Anti-Aérea na frente de Leninegrado. Porém veio a ser feito prisioneiro e foi levado para um campo de concentração alemão onde ainda sem confirmação absoluta existe a informação que foi executado numa câmara de gás.
A guerra civil espanhola contudo foi uma realidade bem mais complexa que muitos imaginam; o próprio pai do Gen. Franco foi um dos seus mais acérrimos críticos; certa vez no verão de 1938 na localidade de El Ferrol onde vivia D. Nicolás Franco quando o vieram felicitar pela nomeação do seu filho como chefe de estado ele replicou: “Qué me viene usted a decir ? Paquito ? Jefe del Estado ? Paquito Caudillo? No me haga reir ! “ Outra vez foi visto na mesma localidade abraçado a uma mala e a berrar a plenos pulmões: “Confiar mi dinero a esos ineptos? A esos ladrones? Ni hablar! Sobre todo desde que el imbécil de mi hijo está en el poder! A mi no me la pegan ¡ “
Ambos os lados utilizaram abundantemente o terror como arma política ; do lado nacionalista evidenciaram-se as tropas mouras provenientes do exército colonial em Marrocos que cometeram barbaridades atrozes sobre tudo o que lhes passava por perto, desde adversários directos até populações civis e nem os mortos lhes escapavam. Por seu turno os membros da Falange também se notabilizaram na eliminação física dos oponentes, mesmo quando não existia a certeza de muitos civis serem simpatizantes da república. A conquista de Badajoz pela coluna do general Yague e as matanças aí ocorridas nomeadamente as execuções sumárias na praça de touros tiveram um certo impacto na vida portuguesa sobretudo através das crónicas do jornalista Mário Neves do Diário de Lisboa.
Por seu turno os republicanos espanhóis divididos em múltiplas facções demonstraram uma fúria quase esquizofrénica na destruição de templos e mesmo em passar pelas armas muitos membros do clero. Ou ainda na realização dos chamados “paseos” (rusgas nocturnas realizadas pelas milícias nas habitações dos visados em que estes eram levados para serem torturados e eliminados) ou na existência de prisões clandestinas denominadas de “checas” sendo estas muitas vezes dirigidas por conselheiros soviéticos com longa experiência na prática do terror stalinista ou no prazer mórbido que os anarquistas possuíam pela terra queimada, vindo estes juntamente com os trotskistas a ser vítimas dos elementos pró- URSS. Em matéria de crimes nenhum dos lados pode aligeirar as suas culpas remetendo-as para o outro, as práticas fratricidas neste tipo de conflitos são infelizmente uma regra . Também a nossa guerra civil cujo período alguns consideram entre 1828 e 1834 mas que na realidade durou quase 30 anos se bem que de forma intermitente – a Convenção de Gramido só foi assinada em 1847 - deixou feridas profundas e contraria definitivamente a ideia que somos um povo de brandos costumes.